quinta-feira, 3 de abril de 2014

O Violão e o Velho




Estavas tão só...
Sentado no tronco
Na imensidão
Do campo florido.

Tangias as cordas,
Num milagre de harmonia,
De teu velho
E decadente violão.

Estavas perdido
Em outra imensidão.
Naquele mundo que é só teu
Da tua provada e confusa mente.

Há longo tempo
Padeces deste mal.
A idade que avança,
Que te consome e te faz penar.

A idade sublime, grisalha
Dos anos incontáveis,
Mas que traz a solidão
Quando aperta, como o nó dos enforcados.

Cantavas baixo
E a voz já fraca, tremulante,
Se unia num anseio, em agonia
Ao som pungente das cordas como em pranto.

E ao ver-te assim tão longe
Do mundo, das gentes, da alegria
Exclamou meu coração, por certo comovido,
Ao som da música divina que brotava de teu ser

- Chora, ó violão, chora.
Que teu amo sofre
E só a ti tem
Por eterno companheiro.

- Chora e não pares nunca
Apega-te a ele para sempre,
Dê-lhe todo o teu calor e componham juntos
O mundo dos que são só.


23-05-1963

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